Guilhermo Santiago nasceu na penúltima cidade do Rio Grande do Sul antes da fronteira com a Argentina - Herval do Sul.
Seu pai fazendeiro gostaria de ter no filho um futuro administrador de seus negócios, no entanto o menino se apaixonou pela música ao ver uma flauta que sua mãe lhe mostrou, depois de ter ficado impressionado com o seu som num programa de TV.
Em suas incursões pelos matagais apaixonou-se pelos sons dos passarinhos, e acabou por fazer ele mesmo uma flauta com as próprias mãos utilizando bambu, e assim imitava os sons da natureza. Aos 14 anos comunicou ao seu pai que iria seguir a carreira de músico recebendo imediatamente a ameaça de que se assim o fizesse teria que sair de casa.
Ato contínuo abandonou sua casa e seguiu para a cidade de Pelotas com um violão e uma flauta quando então se tornou mendigo de rua por um ano dormindo na rodoviária, sem abandonar seu sonho.
Recebia algumas moedas tocando nas ruas da cidade, e após este período pôde, com algumas economias, morar em um quarto de pensão com mais seis pessoas. Formou um conjunto musical com alguns amigos, tocava em barzinhos e bailes para seu sustento, fazendo da arte dos sons o seu ofício.
Mas este é só o começo de uma história extraordinária de uma pessoa que considera a música como uma ferramenta importantíssima na sociedade, e não só como sinônimo de entretenimento. Depois de viajar por diversos países da América do Sul, pesquisando sons e comportamento, foi morar por dois anos com tribos indígenas no alto Xingu e na Ilha do Bananal, dando continuidade às suas pesquisas de comportamento e observou como por meio da música eles poderiam aprimorar qualidades e corrigir defeitos.
Conheci Guilhermo em uma palestra que realizei na Bahia, que foi precedida por outra do nosso personagem. Fiquei fascinado ao vê-lo colocar o público, após 20 minutos de preparação, tocando o tema da Nona Sinfonia, de Beethoven, com garrafas de água, fazendo o mesmo com o Bolero, de Ravel.
Mais do que a realização das peças, fiquei impressionado como ele consegue usar a música como ferramenta para ampliar a percepção de uma pessoa, ou de um grupo, e dar a eles uma noção clara de como fazer uma escolha na vida.
Hoje o antigo mendigo de Pelotas realiza palestras internacionalmente, continua estudando o comportamento humano, especialmente em sociedades mais primitivas, transmitindo experiências que acabam por surpreender àqueles que têm a oportunidade de assisti-lo, participando interativamente dos seus exercícios.
Ao mesmo tempo passou a ter mais um padrinho em sua trajetória de vida – este maestro (e ex-pianista teimoso), que é também colunista da Gazeta Mercantil, e que a cada dia acredita mais do que nunca na frase: "A música venceu".
Dois anos depois de ter "saído" de casa, para lá voltou especialmente para "agradecer" ao pai, mostrando a ele que uma vocação jamais poderia ser abortada na procura da realização de um sonho pessoal.
O pai, arrependido, aprendeu a lição.
Contrariando a vontade do pai, Guilhermo Santiago, se dedicou de corpo e alma a sua vocação musical (Gazeta Mercantil/Caderno C - Pág. 11)
Créditos para: (João Carlos Martins - Regente titular da Bachiana Filarmônica e diretor da Faculdade de Música da FMU).